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sexta-feira, 23 de julho de 2010

Múltiplos caminhos para a tolerância operacional no transplante humano: o desafio de compreender mecanismos e buscar biomarcadores.

Aproveitando o recente post da Lis Antonelli sobre imunorregulação no modelo experimental de transplante cardíaco, quero trazer um pouco desta discussão para o sistema humano, na clínica. Você sabia que existe um grupo muito especial de indivíduos transplantados, chamados de Tolerantes Operacionais que conseguem manter boa função do enxerto e não rejeitam o aloenxerto, após a completa parada das drogas imunossupressoras? Pois é verdade. Geralmente são indivíduos que param de tomar os imunossupressores, por motivos pessoais ou por câncer, e se deparam com esta agradável surpresa. No entanto, é preciso dizer que, infelizmente, muitos dos que se arriscam neste caminho rejeitam e perdem o enxerto.

Mas vamos falar um pouco mais dos que não rejeitam. Certamente temos muito que aprender com eles. Se o sonho do imunologista da área de transplante é descobrir maneiras de induzir tolerância ao aloenxerto, os indivíduos em tolerância operacional são a própria realização deste sonho. Eles estão nos dizendo: nós conseguimos chegar lá! Pois é, a existência desses pacientes é evidência de que a tolerância ao aloenxerto é possível também na clínica.

A comunidade científica internacional tem feito um enorme esforço para estudar esses raros indivíduos, buscando tanto a compreensão de mecanismos como biomarcadores que permitam identificar outros indivíduos que poderiam evoluir para este estado de homeostase. Vale destacar as redes The Immune Tolerance Network (ITN) e a Reprogramming the Immune System for the Establishment of Tolerance (RISET) que muito têm contribuído nos estudos de tolerância. Aqui no Brasil, iniciamos há quase quatro anos um Estudo Multicêntrico em Tolerância Operacional, visando também contribuir para este grande desafio (trabalho ligado ao iii-INCT – Instituto de Investigação em Imunologia – Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia).

A grande dificuldade de se achar esses pacientes tem sido uma grande limitação para o maior avanço dos estudos nesta área. Não obstante, nos últimos anos, tem havido um grande investimento em análises com múltiplos parâmetros e resultados interessantes começam a aparecer.

O grupo da França, em análise de microarray, em células mononucleares do sangue, identificou 49 genes diferencialmente expressos em tolerância operacional no transplante renal, muitos deles relacionados ao TGFbeta (Brouard et al., 2007), e esta assinatura de tolerância está sendo testada em outra coorte de pacientes estáveis em uso de imunossupressão convencional. Mais recentemente, foi publicado um trabalho com o maior número de pacientes transplantado renais em TO (n=25), no qual foi apontado um perfil diferencial para células B, em diferentes análises (Newel et al., 2010), mas não houve concordância com os genes descritos no trabalho do grupo francês. Em nosso Estudo Multicêntrico aqui no Brasil, observamos uma diminuição da ativação de STAT6 para a população de monócitos, nos pacientes em TO de transplante renal, apontando mais uma potencial via imunorreguladora no estado de TO (Mendes et al., 2010).

Analisando o conjunto da literatura em TO, parece haver múltiplos caminhos relevantes neste estado de tolerância no transplante. Parece-me ser ainda cedo para afirmar que qualquer desses achados em TO seja uma assinatura com aplicação imediata na clínica. Certamente serão necessários novos estudos prospectivos para se testar, de forma mais consistente, essas diferentes potenciais assinaturas do estado de tolerância operacional. Se realmente múltiplos caminhos imunorreguladores forem ativados no estado de tolerância operacional, a combinação de múltiplos parâmetros parece-nos uma estratégia promissora para definir uma potencial assinatura para este estado de homeostase no transplante humano. A seleção desses parâmetros ainda é um desafio. Daremos mais notícas sobre o andamento desta história!


Algumas referências relacionadas

1) Brouard S, et al. Identification of a peripheral blood transcriptional biomarker panel associated with operational renal allograft tolerance. Proc Natl Acad Sci U S A.104(39):15448–15453, 2007.

2) Kenneth A. Newell, Adam Asare, Allan D. Kirk, Trang D. Gisler, Kasia Bourcier, Manikkam Suthanthiran, William J. Burlingham, William H. Marks, Ignacio Sanz, Robert I. Lechler, Maria P. Hernandez-Fuentes, Laurence A. Turka, Vicki L. Seyfert-Margolis for the Immune Tolerance Network ST507 Study Group.
Identification of a B cell signature associated with renal transplant tolerance in humans. J. Clin. Invest. 120(6):1836, 2010.
http://www.jci.org/articles/view/39933/version/2

3) Pervinder Sagoo, Esperanza Perucha, Birgit Sawitzki, Stefan Tomiuk, David A. Stephens, Patrick Miqueu, Stephanie Chapman, Ligia Craciun, Ruhena Sergeant, Sophie Brouard, Flavia Rovis, Elvira Jimenez, Amany Ballow, Magali Giral, Irene Rebollo-Mesa, Alain Le Moine, Cecile Braudeau, Rachel Hilton, Bernhard Gerstmayer, Katarzyna Bourcier, Adnan Sharif, Magdalena Krajewska, Graham M. Lord, Ian Roberts, Michel Goldman, Kathryn J. Wood, Kenneth Newell, Vicki Seyfert-Margolis, Anthony N. Warrens, Uwe Janssen, Hans-Dieter Volk, Jean-Paul Soulillou, Maria P. Hernandez-Fuentes, Robert I. Lechler.
Development of a cross-platform biomarker signature to detect renal transplant tolerance in humans. J. Clin. Invest. 120(6):1848, 2010.

4) Turka, Laurence A; Wood, Kathryn; Bluestone, Jeffrey. Bringing transplantation tolerance into the clinic: lessons from the ITN and RISET for the Establishment of Tolerance consortia. Current Opinion in Organ Transplantation: Volume 15 - Issue 4 - p 441–448, 2010.


5) Moraes-Vieira PM, Silva HM, Takenaka MC, Monteiro SM, Lemos F, Saitovitch D, Kalil J, Coelho V. Differential monocyte STAT6 activation and CD4(+)CD25(+)Foxp3(+) T cells in kidney operational tolerance transplanted individuals. Hum Immunol. 2010 May;71(5):442-50, 2010.

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